A recente movimentação diplomática protagonizada por aliados do ex-presidente Donald Trump, com a chegada de uma delegação americana a Brasília, levanta questionamentos importantes sobre o objetivo central desse reencontro político. O gesto evidencia uma tentativa clara de reaproximação com Jair Bolsonaro, figura que representou, durante anos, um parceiro estratégico para as políticas externas promovidas pelo governo anterior dos Estados Unidos. A escolha por iniciar esse novo ciclo de conversas justamente no Brasil não é aleatória, mas parte de uma estratégia bem delineada de reconstrução de alianças que marcaram o último governo republicano.
Durante o período em que Trump esteve à frente da Casa Branca, o relacionamento com Bolsonaro se destacou pela convergência ideológica, pelo alinhamento em pautas conservadoras e pela cooperação estratégica em fóruns internacionais. A relação entre os dois foi vista por muitos como uma aliança rara na política global contemporânea, baseada mais em afinidades pessoais e visão de mundo do que em protocolos tradicionais de diplomacia. Agora, com o cenário político norte-americano prestes a entrar novamente em uma fase eleitoral decisiva, restabelecer essas conexões se torna uma prioridade para os círculos próximos ao ex-presidente.
O retorno desse diálogo tem implicações profundas, especialmente considerando o papel de Bolsonaro como figura de influência ainda ativa no Brasil. Mesmo fora do cargo, ele mantém uma base consolidada e atua como liderança simbólica da direita brasileira. Para o entorno de Trump, essa conexão direta com lideranças ideológicas ao redor do mundo faz parte de um projeto de reposicionamento global que mira a retomada do protagonismo conservador internacional. Em um contexto onde disputas narrativas e estratégias geopolíticas estão em ebulição, reforçar vínculos com atores ideologicamente alinhados é visto como uma ação de peso.
A presença da delegação liderada por David Gamble, com foco em temas como sanções e relações internacionais, reforça que a visita vai muito além de um gesto simbólico. Os interesses por trás dessa aproximação passam por temas sensíveis como o reposicionamento do Brasil em blocos internacionais, segurança estratégica e cooperação regional. Para o grupo ligado a Trump, o Brasil ainda é considerado um parceiro essencial na construção de uma frente comum de resistência a projetos globalistas e de reafirmação da soberania nacional como valor central da política externa.
Além disso, essa retomada de contatos também representa uma resposta ao avanço de outras potências no continente sul-americano. A influência crescente de países asiáticos e o reposicionamento de agendas europeias na região preocupam estrategistas americanos que buscam manter influência relevante no Hemisfério Sul. A aposta em uma figura como Bolsonaro, que já demonstrou disposição para alinhamentos firmes com os EUA no passado, pode representar uma forma rápida e eficiente de conter avanços contrários aos interesses norte-americanos, especialmente se o objetivo for preparar o terreno para uma eventual volta de Trump ao poder.
Internamente, o movimento também serve como sinal para as bases eleitorais nos dois países. Para o público conservador norte-americano, essa retomada de conversas simboliza a continuidade de uma agenda que valoriza aliados firmes e uma política externa agressiva. Já no Brasil, o gesto pode ser interpretado como um reconhecimento internacional da relevância política de Bolsonaro, o que pode fortalecer sua imagem diante de apoiadores e do cenário político interno. O momento, portanto, é ideal para que ambos os lados capitalizem essa reaproximação de forma estratégica e eleitoral.
Mesmo diante de resistências institucionais e críticas à condução anterior das relações bilaterais, a intenção de manter Bolsonaro como interlocutor privilegiado sinaliza que o governo Trump, ou pelo menos sua esfera de influência, aposta fortemente na continuidade de alianças pessoais. Essa abordagem contrasta com a diplomacia tradicional baseada em relações entre Estados, priorizando, em vez disso, laços ideológicos que podem sobreviver a trocas de governo. Isso explica o esforço atual para restabelecer contato direto, ainda que fora de canais oficiais, com o ex-presidente brasileiro.
No fim das contas, essa nova investida diplomática carrega uma carga simbólica e estratégica que não pode ser subestimada. Trata-se de mais um capítulo na tentativa do grupo de Trump de consolidar uma rede internacional de apoio baseada em princípios comuns e visão compartilhada de mundo. Jair Bolsonaro, mesmo sem um cargo formal, continua sendo uma peça importante nesse tabuleiro, e o esforço para retomar o diálogo mostra que os laços formados no passado ainda são considerados valiosos para o futuro geopolítico que esse grupo pretende moldar. O desenrolar dessas conversas pode ter consequências duradouras para a política externa de ambos os países.
Autor : Valery Baranov